Há algum tempo atrás numa
superfície comercial aqui na ilha, cruzei-me com um irmão romeiro, que me
apelidou de irmão cartuxo. Confesso que pequei um pouco, por ter levado aquela
observação como um elogio, tendo em conta o sentimento que nutro por essa ordem
religiosa. Na verdade e parafraseando São João Batista , se ele não se sentia
digno de Lhe desatar a correia das sandálias 1, que direi eu sobre eles,
perante os quais, mais do ser um eterno pecador, falta-me a simplicidade e a
humildade que eles possuem, entre outras atitudes essências e fundamentais como
Cristão. Depois de outras palavras
trocadas com o irmão romeiro, este terminou o seu raciocínio dizendo que “as
ordens contemplativas são
“ o p u l m ã o , a s r a í z e s e a s
f u n d a ç õ e s d a I g
r e j a ". Um raciocínio certo e verdadeiro. Depois de ter utilizado as
primícias descritas no Scala Claustralium 2, isto é, depois da leitura cuidada,
a meditação possível sobre estas palavras, oração ao Pai para que me iluminasse
e alguma contemplação , dentro dos meus parcos conhecimentos, deparei-me com
imagens profundas e ricas (dentro do espírito e vivência das ordens
contemplativas), as quais passo a explicar: - Qualquer uma das três palavras
refere-se a existências não visíveis aos olhos dos comuns mortais. Todas estas
existências encontram-se no interior de algo, seja no corpo humano,
debaixo da terra ou por baixo das paredes que sentimos, tocamos ou vemos - Depois da imagem acima descrita, deparei-me
com mais uma. Apesar de não serem visíveis, todas elas são o fundamental para a
existência do que suportam. O ser humano não vive sem os pulmões, porque sem
eles não respirava, assim a sua existência estaria em causa. As árvores, por
muito belas, frondosas, com ou sem flores ou frutos e por muito altas que
possam ser, não existiriam se não tivessem raízes. As igrejas, por muito arrebatadores
que possam ser, por muitos milagres que tenham presenciado e por muitos crentes
fervorosos de fé em oração que possam conter, não existiriam sem fundações. -
Uma terceira imagem ocorreu-me há dias. Talvez mais suscetível de discussão
fraterna, talvez uma imagem exacerbada de um coração impuro e alma pecaminosa,
mas sempre no intuito de não me afastar de Deus, tendo Maria como mediadora. “
Separados de todos, estando unidos a todos já que é em nome de todos que se mantém
na presença do Deus vivo”3 oram incessantemente por nós. Assim como os pulmões
transformam o dióxido de carbono em oxigénio, também as suas orações
seguramente transformarão as nossas ações manchadas de pecados em virtudes. No
que respeita às raízes, são elas que dão a força, o vigor e a energia às
árvores. São também elas que levam os elementos vitais ao corpo que as suporta
e que sem elas não seriam nada, sem elas também não conseguiam suster-se de pé
e apontar-nos o caminho para o Altíssimo, tal como aqueles e aquelas que, sobretudo
através do seu silêncio e solidão fecundos, unem a sua alma ao Verbo de Deus, a
esposa ao Esposo, a terra ao céu, o humano ao divino 4, por Cristo, que é o
Caminho, a Verdade e a Vida 5. As fundações da Igreja, mais do que pedras,
somos todos nós as pedras vivas 6 da Igreja, mas mais do que nós, a vida
contemplativa é o combustível para alimentar e revigorar os membros do imenso
corpo que é Cristo, muitas vezes cansados e abatidos, restituindo-lhes a
vitalidade e a frescura que precisam para continuarem a edificar 7 o Reino de
Deus no mundo. Quase a terminar sinto que todas as ordens contemplativas são
como pedra angular 8 e todas elas nesta sociedade em que vivemos e estão
inseridas, cada vez mais são tidas como ultrapassadas, cada vez mais rejeitadas
9.
por: Victor Henriques
por: Victor Henriques
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